A comparação falso entre Africa e Asian dragões
Existe uma lenda colonialista zelosamente conservada afirmadora de que a África estaria melhor repartida nos anos 60 do que os 4 tigres asiáticos: Coreia (do Sul), Taiwan, Malásia e Indonésia.
Na verdade trata-se um ardil geoestratégico que visa três objetivos principais: primeiramente eximir os europeus da pesada responsabilidade pela espoliação e pela (má) sorte de centenas de milhões de africanos levados à miséria e, em seguida, convencer a estes mesmo africanos que eles nada valem, que eles de nada são capazes e que seria melhor deixar a Europa ditar a agenda política, econômica e social no continente africano. E, em terceiro lugar, os europeus se valem deste refrão mentiroso para criar uma cortina de fumaça que impediria os africanos de avaliar a credibilidade e a competência reais desses europeus com base no seu passado africano, ou seja, a partir de seu próprio balanço do extenso período em que os africanos cuidaram da gestão e organização do seu próprio continente.
DOIS EXEMPLOS NOS PERMITIRÃO COMPREENDER BEM MEU ENFOQUE: CAMARÕES E TAIWAN
Visto que os dois países não têm a mesma estrutura, não parece conveniente comparar o Camarões de 1960 a Taiwan e sim principiar com o mesmo Camarões 50 mais tarde afim de se averiguar quais dos antigos administradores (os franceses) e dos novos gestores (os camaroneses) se mostraram mais incapazes. Se os novos são mais estúpidos do que os antigos, então há uma base de partida para a hipótese de se prosseguir na comparação.
Comecemos por ver o balanço de Alemanha, França e a Grã-Bretanha nas gestões por eles levada a cabo em Camarões, de 1884 a 1916 pela primeira, de 1916 a 1961 pelas duas últimas, uma a Leste e a outra a Oeste do país. Antes da independência em 1960, cerca de 80% da população camaronesa habitava as cidades e a administração colonial não criara qualquer escola nessas áreas, como decorrência disso menos de 3% dos camaroneses eram escolarizados na ocasião da independência; em 2011 o nível de escolaridade chegaria a 96%. No passado colonial não havia qualquer universidade; 50 anos mais tarde havia uma dezena.
Para a saúde pública, em 1961, após 32 anos de ocupação alemã, 45 anos de ocupação francesa e britânica, Camarões contava com 3 hospitais, em geral destinados ao tratamento dos invasores. Em 2011, 50 anos após, o balanço é mais animador, pois há três dezenas de hospitais. No tangente à água potável e à eletrificação, em 1961 Camarões era um país envolto na escuridão da noite; a população ia buscar água no rio das cidades e aldeias ou nos poços construídos pertos de fossas sépticas. 50 anos depois a água potável ainda não está garantida, mas se acha disponível a número infinitamente maior de pessoas do que na época da ocupação britânica e francesa. O mesmo se aplica aos quilômetros de estradas pavimentadas. Em 1961, no plano administrativo, apenas 4% de população era registrada ao nascer e se beneficiava com uma certidão de nascimento. 50 anos depois quase 100% da população têm uma certidão de nascimento. Para corrigir as deficiências administrativas dos europeus, os novos dirigentes de Camarões se viram obrigados a gerar certidões de nascimento a posteriori, com a menção nascido POR VOLTA DE... Como a maior prova documental da notória incompetência dos ocupantes europeus. Assim pode-se concluir sem risco de erro que os invasores europeus de Camarões, os alemães, os franceses e os britânicos foram verdadeiros cancros nos planos econômico, administrativo e social, basta observar o balanço de 77 anos de ocupação de Camarões.
Atualmente sabemos em que condições os camaroneses assumiram a administração da sua pátria em 1961. Ou seja, era uma nação paupérrima, um país que mais parecia um campo de sobrevivência perdido no deserto tropical. Que comparação podemos então fazer com o tigre asiático Taiwan? Eis 6 razões para a mentira da inútil comparação entre a África e a Ásia, com o único e exclusivo objetivo de gerar uma confusão para, assim, disseminar a ideia destrutiva de uma África agonizante e incapaz do menor esforço:
1 Em 25101945 as tropas japonesas baseadas em Taiwan se rendem aos norte-americanos, isso após 50 anos de colonização e de política de assimilação possibilitadoras do desenvolvimento de infraestrutura industrial e de uma base de intelectuais. Isso significa que depois de 1895 Taiwan foi administrada como uma extensão do Japão, como a nação japonesa, ou seja, como uma nação poderosa. Ademais Taiwan não segue este curso na mesma época que os países africanos e sim 15 anos antes e, tampouco, parte da etapa zero no plano econômico ou intelectual (há bibliotecas, livrarias, editoras, imprensas, jornais e prêmios literários). Nesta mesma data, em 1945, os africanos – aos olhos dos ocupantes franceses e britânicos – nada mais são do que primitivos ou, mais gentilmente, autóctones a se utilizar como escravos. E a partir de 1945 Taiwan passa de fato a tutela dos Estados Unidos da América; torna-se um país-chave no impasse pela batalha pela liderança da China continental. Não foi por mero acaso que seu protegido Tchang Kai Check se refugiaria nesta ilha após a derrota para Mao, fazendo desse um dos teatros dos acontecimentos políticos dos mais estratégicos no início da guerra fria e palco dos acontecimentos mais inusitados da história do século XX: a partir de uma ilha de apenas 35.000 km² com 370 km de comprimento e 140 de largura (posto avançado do capitalismo norte-americano) pretendia-se lançar um assalto e conquistar o terceiro maior território do mundo, a China, com seus 9.641.144 km², para assim evitar que ela fosse tomada pelo comunismo, o que não poderia ser o caso de qualquer país africano.
2- Desde 1945 a dinâmica japonesa é monitorada pelos Estados Unidos da América que fazem uma espécie de Plano Marshall para acompanhar a reforma agrária e a nova industrialização do arquipélago com o objetivo de estimular ao máximo a necessidades internas e satisfazê-las. E assim que surgem os pequenos proprietários com os fundamentos de pequenas empresas, as mais ramificadas do mundo graças às generosas doações do mentor norte-americano, o que não é o caso de qualquer país africano, pois os africanos que tomaram o poder após a independência devem, todos eles, aplicar a política econômica ditada pelo mentor (França ou Grã-Bretanha), bem ao contrario do que os norte-americanos implementam em Taiwan. Isso significa que não há qualquer estimulo à marcha interna, pois tudo continua baseado nos antigos produtos, ditos coloniais, como e o caso do café, do cacau ou da banana, totalmente destinados a exportação para os países dos antigos ocupantes, sem possibilidade alguma de redirecionamento as nações africanas, pois não há qualquer mercado interno, e tampouco qualquer crescimento exponencial demandado pela ascensão das trocas internas.
3 - A partir de 1955, as exportações de Taiwan podem assim começar a oferecer ao mundo pequenas máquinas agrícolas que a ilha desenvolveu inicialmente para os seus próprios campos, e também pequenos artigos oriundos da profusão de indústrias leves. Enquanto isso os africanos permaneciam petrificados nas culturas de produtos agrícolas ditos coloniais, os quais eles próprios não consumiam e também à mercê de um mercado internacional que eles não podiam dominar.
4 - o plano puramente político, os países africanos não representavam qualquer problema para seus mentores além do fato de que eram simples reservatórios de votos para as Nações Unidas a fim de aumentar a credibilidade ou o peso político da Franca e da Grã-Bretanha e justificar seus lugares como membros permanentes no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Enquanto os norte-americanos tinham necessidade de um Taiwan forte econômica e politicamente para convencer a eles próprios de que não haviam feito a escolha errada na China ao escolher Tchang Kai Check em vez de Mao Tsé Tung, utilizando a ilha justamente como um ponto de partida para a revanche do fracasso ante as tropas de Mao, ainda que eles fizessem inscrever na própria constituição de Taiwan que a ilha e zona de administração provisória à espera do retorno a Pequim. Por esta razão é que Taiwan foi escolhida nas Nações Unidas como representante de todo o povo chinês, e não a China continental. Tal manipulação política só poderia tornar Taiwan um país singular e situado na rampa de um desenvolvimento meteórico com taxas de crescimento de dois dígitos anuais desde 1950 e que permanecerá em tal nível durante as duas próximas décadas.
5 - Por ocasião das tempestades de reivindicações pelos direitos cívicos em 1965, o presidente dos Estados Unidos Lyndon Johnson, que sucede ao assassinado John Kennedy, promulga uma lei para reformular a lei de imigração vigente a partir de 1920 a qual só encorajava a imigração de brancos do norte da Europa, os arianos puros, para os Estados Unidos. A nova lei permite aos habitantes da ilha maior mobilidade para os Estados Unidos e também melhor integração de sua economia à norte-americana. Esse não foi o caso das nações africanas, sempre consideradas pelos europeus como uma peste a ser contida no seu ambiente natural, isto e, como animais confinados para sempre no seu zoológico, a África., e que, a bem da verdade, só é gravada na memória da maioria dos europeus como um grande zoológico, não tendo outro valor que não o dos animais que lá habitam e sua vegetação a ser salva a qualquer preço como reivindicam com ares de justiça os ecólogos. Que importam os homens e mulheres que vivem lá?
6 - Em 2009 o primeiríssimo investidor na República Popular da China era Taiwan, e não o Japão ou os Estados Unidos da América, porém exame mais acurado não esconde o fato de que falar de Taiwan é, indiretamente, falar do próprio Estados Unidos no plano econômico, sobretudo após a crise econômica dos anos 90, ocasião em que várias indústrias de ponta foram salvas, tanto em Taiwan como na Coreia, gracas ao capital norte-americano para lá transferido para garantir o sucesso dos seus protegidos. Ao mesmo tempo os mentores dos países africanos se indignavam que a China estivesse investindo na África, chegando ao ridículo do presidente da república francês propor a Pequim uma coordenação conjunta dos investimentos industriais que a China faz na África. Isso demonstra que ele próprio não compreendeu que nada fora feito para merecer tal magnanimidade, mas que cada gesto corresponde a um peão movido, como num jogo de xadrez, em função de seus próprios interesses geoestratégicos. Pequim sabe que para se tornar uma superpotência é necessário que uma potêncial atual ceda seu lugar, e esse lugar ocupado pela Europa deve ser reconquistado. Assim sua melhor estratégia consiste em enfraquecer essa Europa naquilo que esta considera seu botim do futuro, a África, e isso está em curso. A proposta de um chefe de Estado francês ou britânico de que a China lhes delegue poderes para atuar na África equivale a dizer que a China poderia, em 1965, pedir a Washington que passasse para ela os investimentos em Taiwan, não compreendendo que Taiwan era justamente o trampolim para atingir a própria China. Como se pode comparar Taiwan aos países africanos se até seus mentores não se acham em condições de compreender até que ponto e que tipo de jogo se está jogando?
Esta análise pode ser estendida aos 3 outros tigres, pois no período da guerra fria todos serviram como laboratório de comunicação e de propaganda ocidental para provar a outra parte que seu sistema capitalista marchava muito bem. O que se depreende de todos estes seis pontos é que nossos benfeitores de domingo, ao afirmarem que em 1960 a África estava melhor do que os tigres asiáticos ou nada compreenderam ou então pecam por ignorância e ingenuidade.
A objeção por eles apresentada é a de que a suposta superioridade da África na época estava no plano do Produto Interno Bruto (PIB). Esta é uma inverdade pois na ocasião da independência as riquezas contabilizadas nesse PIB pertenciam quase todas às populações francesas e britânicas, especialmente a quase totalidade da produção agrícola.
CONCLUSÃO
Afirmar que a África estava em melhor situação em 1960 que os tigres asiáticos é mentira sustentadora da tese de que os africanos são uma nulidade e que fariam melhor em confiar a gestão de seus países aos antigos invasores. Trata-se de uma incitação a agir por procuração. Trata-se de renunciar a um mínimo de soberania para, assim, confiar o destino das nações africanas à gestão europeia. A juventude africana precisa compreender que ela deverá se armar de conhecimentos e de ambição para desempenhar todo o seu papel na gestão política, econômica e administrativa do continente africano. As armadilhas para levá-las às cadeias invisíveis de submissão são numerosas e frequentemente surgem onde menos se espera. A vigilância e o rigor intelectual devem guiar todo o pensamento, bem antes da ação.
* Jean-Paul Pougala enseigne Géostratégie Africaine en Master2 à l’Institut Supérieur de Management (ISMA) à Douala au Cameroun. Cet article est le résumé du cours du