O trabalho escravo contemporâneo no Brasil e a permanência da questão racial.
http://www.pambazuka.org/images/articles/13pt/53957_tmb.jpgWalter Rodney, ainda um autor polemico e desconhecido no Brasil, quando escreveu “Como a Europa subdesenvolveu a África” não pensou em como a escravidão desenvolveria o Brasil e países asiáticos. O gigante da America Latina tem uma divida com as populações negras que são reflexo da escravidão de africanos nestas terras. Ou como explicar a perpetuação de alguns paradigmas escravocratas?
Em 2009, o Fórum Social Mundial aconteceu na região amazônica, cidade de Belém, no estado do Para - Brasil. Neste encontro, que durou seis dias, com muitas discussões, analises e protestos, esquerdistas e militantes de todo mundo mostraram que existe sim alternativas a esse sistema capitalista que somente pode ser definido como genocidario que cada dia mais criminaliza a pobreza e os movimentos sociais organizados.
Neste artigo apresentaremos os argumentos que balizam a discussão em torno da vergonhosa realidade de nosso pais, principalmente na região Amazônica: a persistência do trabalho escravo 110 anos apos a abolição da escravidão de africanos no Brasil. Não coincidentemente, segundo pesquisas recentes, a maioria dos trabalhadores não-assalariados, escravizados em lavouras do setor sucro-alcooleiro são afro-descendentes. Alguém ainda duvida que a pobreza tem cor neste pais?
De acordo com jornais locais, o Fórum Social Mundial conseguiu reunir em Belém aproximadamente 100.000 pessoas. E, não aleatoriamente, a época do Fórum coincide com o Fórum Econômico Mundial em Davos. Muitos lideres governamentais da esquerda compareceram para as discussões, numa tentativa de enfrentar a atual crise mundial, que tanto afeta os países em “desenvolvimento”. O papel principal do Fórum Social ‘e de servir como uma ampla rede de discussão e oportunidade para esquerdistas do mundo inteiro. Este ano, a crise global financeira foi o foco e os debates e criticas caíram sobre o mercado livre e o fim do capitalismo.
Como co-editora do Pambazuka News em língua portuguesa, participei das discussões sobre trabalho escravo no Brasil, e a partir dos debates nas mesas-redondas, elaboramos uma reflexão que quica servirá de base para futuras discussões e que interessa aos nosso leitores ativistas e articulistas.
Na tenda da Irma Dorothy, o tema foi o Trabalho Escravo Contemporâneo, e um ouvinte mais desavisado ficaria estupefato com as artimanhas do sistema econômico brasileiro para sustentar, em pleno ano de 2009, em pleno século 21, o trabalho escravo, que vai desde o trabalho escravo infantil em carvoarias, do trabalho não-remunerado em campos sucro-alcooleiros, ao trabalho escravo de imigrantes bolivianos em São Paulo.
Brasil, China e Índia formam hoje o bloco político e econômico de grande forca no mundo dito emergente, entretanto não devemos perder de vista que um dos fatores que unem esses países rumo a liderança mundial ou a uma liderança no sul do mundo e a exploração da mão-de-obra barata e do trabalho escravo nas bases de sua produção, vejam se as vergonhosas estatísticas do Brasil no setor energético, de acordo com relatório da Repórter Brasil. Países asiáticos na concorrência da produção mundial não se importam com os direitos básicos dos trabalhadores, e o Brasil, apesar de figurar nas estatísticas do trabalho escravo, opera uma certa liderança na tentativa de erradicação do problema, apesar de toda resistência ao enfrentamento que essa questão suscita. De acordo com a OIT, o empenho do Brasil na errdicaçao do trabalho escravo e um modelo.
A informalidade do trabalho no Brasil chega aos 130 milhões de trabalhadores, e de acordo com Francisco, auditor Fiscal do Trabalho, esse fato por si só, beira a escravidão de milhares de pessoas em idade produtiva. Seria o caso de tentarmos questionar então o que vem a ser trabalho informal? Será que as regras não transpuseram a norma na adjetivação do que seja formal e informal?
De acordo com pesquisa feita pelo Grupo de pesquisa do trabalho escravo da Universidade de São Paulo (USP) existe um perfil deste trabalhador escravizado, e duas perguntas nortearam a pesquisa: quem são os escravizados e quem são os escravizadores? Tal estudo foi crucial para um mapeamento da questão no Brasil e para a implementação de políticas publicas de repressão ao trabalho escravo.
Três categorias estão envolvidas no processo: de um lado o trabalhador a ser escravizado, empobrecido e sem perspectivas de sobrevivência em seu lugar de origem, o gato, o mediador e o ilusionista desse trabalhador, e da outra ponta, o empresário ou fazendeiro que explora esta mao de obra. No meio rural, a maioria desses trabalhadores são homens, na faixa etária dos 30 anos, 18% são analfabetos e sem formação profissional, e o não mais surpreendente aos nossos leitores, 80% (oitenta por cento) deles são negros. Já os empregadores são do sexo masculino, brancos e com nível universitário, geralmente administradores de empresa, agrônomos e veterinários. Alguma relação com uma historia nossa bem conhecida? Continuando...esses trabalhadores geralmente migram do Norte e Nordeste do pais, e em especial do Maranhão, eles vivem na periferia da cidade ou em povoados rurais e foram expulsos do campo. Já os empregadores são do sudeste do Brasil ou moram em capitais da região Nordeste ou Norte do pais.
No quesito família, e importante salientar que os trabalhadores vivem com suas famílias e 44% deles representam a única fonte de renda deste núcleo. No que concerne aos empregadores, eles são chefes de família e tem seus filhos estudando em universidades. Sobre a propriedade das terras, os trabalhadores, 70% não tem a posse da terra, ou eles trabalham por arrendamento ou meia. Os empregadores, obviamente vem de famílias de grandes proprietários de terra do Norte e Nordeste, principalmente da recente ocupação amazônica.
Existe um fato que deve ser destacado nessa argumentação e que chama a atenção, o que faz esse trabalhador ser escravizado? Uma investigação resultou em saber que em sua maioria, esses mesmos homens um dia foram trabalhadores infantis, ou faziam trabalhos temporários, e quanto aos nordestinos, eles tem que normalmente se deslocar para conseguir emprego. 60% desses homens já haviam passado por algum tipo de privação de liberdade: ou gerada por divida ou por distanciamento geográfico.
Um fato que chamou a atenção foi o fato de que a maioria das fazendas onde ha trabalho escravo, são altamente desenvolvidas tecnicamente, e ha uma combinação do trabalho precário e escravo com maquinaria altamente qualificada e cara, produtos de importação.
Um dado trazido para a discussão foi o fato de que 10% dos trabalhadores regatados do trabalho deshumano relatou que já tinham sido escravizado antes, logo, sem uma política de inserção no mercado legal de trablho, e uma intensa fiscalização por parte dos órgãos governamentais será impossível a erradicação desta forma de “trabalho” que em nada dignifica o homem. Alguém se lembra de política publica do Brasil pos-abolição para os escravos libertos? Alguma dificuldade em estabelecer paralelos?
Qual nao sera o preco que o povo brasileiro devera continuar pagando para que seu pais integre o grupo do BRIC ou que sejamos o primeiro produtor mundial de bio combustivel? Juntarmos a luta contra a escravidao no campo e nas relacoes de trabalho e lugar por um mundo melhor, com justica (sem o adjetivo social) apenas justica para todos, e lutar pela insercao do negro em condicoes de igualdade de disputa no mercado de trabalho, e lutar contra o racimso sutil e violento deste pais, e lutar contra a face mais horrenda o capitalismo: a deshumanizacao e a criminalizacao da pobreza!
*Alyxandra Gomes Nunes atua como co-editora do Pambazuka Língua Portuguesa e também é doutoranda em Estudos Étnicos e Africanos na Universidade Federal da Bahia - Brasil
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