Elite africana e a mídia ocidental

Elite africana e a mídia ocidental

Respodendo aos esforços de intelectuais para reparar a imagem oprimida do povo Africano, Chielo Zona Eze nos recomenda veementemente a reconhecer que “estamos para além do mundo que foi modelado por ideias do século 19 sobre Africanos”. Enfatizando que ele vê pouca probabilidade que as dificuldades Nigerianas estarão chegando ao fim em breve, o autor nos pede para considerar uma “mudança de postura que comece com uma rejeição radical do pensamento de que o Ocidente está interessado apenas em cavar o território Africano’.

A mitologia grega coloca que Sisyphus, que foi o rei de Ephyra (Corinto), foi condenado pelos deuses a rolar uma grande pedra por uma montanha acima. Toda vez que ele chegava ao topo, a pedra rolava morro abaixo. E ele começava tudo de novo, dia após dia. Albert Camus nos fala para imaginarmos Sisyphus feliz. Em certos contextos, eu consigo fazê-lo. Porém, na maioria dos casos, eu acho difícil acreditar que rolar um enorme seixo por um montanha acima sabendo que ela irá rolar de volta poderia jamais satisfazer uma mente racional.

Eu acho que é exatamente isso que a elite africana faz em sua tarefa conferida por Deus de defender a África contra a mídia do Ocidente que, dizem, estão para o mal estar social e moral Africano assim como os abutres estão para as carcaças ao longo do Serengeti. O intelectual Africano está em uma situação difícil; eles estão posicionados entre condições sociais inaceitáveis em sua terra natal e a necessidade de lutar contra o Ocidente por seu interesse exclusivo naquela condições.

Foi com angústia palpável que eu assisti o discurso extraordinariamente belo de Chimamanda Adichie, ‘O perigo de uma estória única’ ,[1] em defesa da imagem Africana. Eu não pude evitar pensar na defesa obstinada de Chinua Achebe da mesma postura, um projeto que modelou mais de 50 anos de sua vida intelectual. Há pouca dúvida sobre aquilo que Achebe e outros como Wole Soyinka e Nggwa Thiong’o demonstraram de que o Africano tem a sua história.

Assim sendo, décadas após seus esforços para retificar a imagem danificada do Africano, não há razões para acreditar que nós já estejamos para além do mundo que foi modelado por idéias do século 19 sobre o Africano. Se os pensadores Europeus dessa época – ou mesmo Joseph Conrad no pensamento de Achebe – viram o Africano como privado de racionalidade e portanto incapaz de se controlar, a elite africana de hoje, sem dúvida, tem tudo que precisa para mudar a sorte da África. Ainda assim, eu não consigo livrar-me da importunante suspeita que eles podem, de fato, estar na trajetória errada para atingir esse objetivo.

Eu tinha 5 anos de idade quando uma guerra Civil estourou. Quando ela terminou, três anos e meio mais tarde, eu já havia visto mais do lado feio da humanidade, experienciado mais dores do que a maioria das pessoas jamais imaginariam em toda sua vida. Meus impulsos de sonhar tem sido moderados pela percepção chocante, durante a guerra, que eu podia morrer a qualquer minuto sem que meu povo tivesse para do para respirar por nem um segundo. Esse pessimismo tem sido endurecido não apenas pela deteriorização constante da vida na Nigéria, mas também pelas guerras e instâncias de abusos de direitos humanos em várias partes da África. Eu tenho visto a morte; eu não tenho visto muito do lado mais brilhante da vida na Nigéria que sugira que a guerra civil tenha realmente terminado.

Não que eu tenha que uma boa estória pessoal para contar. Quase ao contrário, minha vida é um exemplo singular da capacidade humana de amar de suportar adversidades. Tendo sobrevivido a má nutrição e as doenças resultantes da mesma durante a guerra civil, graças a intervenção extraordinária de agências de assistência mundiais como a Irish Concern, e auxiliada por instituições Católicas que me concederam uma bolsa de estudos gratuita em vários estágios de minha carreira, eu atingi o grau mais alto possível na disciplina acadêmica que escolhi. Para mim, a vida é um milagre.

Eu sobrevivi, eu tenho sucesso. Mas muito, que triste, demasiadas crianças nigerianas da minha idade não tiveram tanta sorte quanto eu. Milhões e milhões mais, nascidos depois da guerra, tornaram-se vítimas do enorme desgoverno que tem caracterizado os governos Nigerianos desde a independência. A maioria era tão talentosa quanto eu sou. Alguns até mais. Alguns nunca seriam capazes de alimentar suas famílias.

Talvez, eu não deveria escrever sobre a África das maneiras condenadas pelo escrito queniano Binyavanga Wainaina em “Como escrever sobre a África”. (2) Eu não deveria escrever que a África tem sido dilapidada por líderes Africanos, ou que um número demasiado de africanos perdem suas vidas em função de atos insensatos de brutalidade. Eu gostaria realmente de cantar louvores para a Mãe África.

Talvez tenha sido a minha parte ingênue que me forçou às lágrimas quando eu visitei a Nigéria em julho de 2009 e descobri que universidades nacionais na Nigéria estavam em greve desde abril? A greve continuo até o início de outubro. Sendo realista, ou talvez apenas dúbio como eu havia sido condicionado a ser, eu não viajei para a Nigéria com o meu laptop. Eu sabia que lá eu não teria constante abastecimento de energia. Certamente, os quarto dias que eu passei com meu irmão e sua família em Lagos confirmaram o meu realismo. Como muitos Nigerianos sinceros, e trabalhadores sérios Nigerianos, que não estão prontos para sucumbir à escuridão Nigeriana, meu irmão tinha um gerador elétrico.

Assim como seus vizinhos também nos outros três apartamentos da casa. Por quase toda a noite esses quarto geradores sopraram e bufaram obedientemente servindo aos seus donos. Para que nos ouvissemos, quase que tínhamos que gritar porque o gerador estava na varanda. Eu tinha dificuldade para respirar por causa da fumaça que entrava no apartamento. E quando eu acordava no meio da noite para me aliviar – o gerador era desligado `as 12 – eu tinha que tatear o meu caminho até o banheiro como a ajuda da fraca luz do meu celular Nokia.

Ao longo da próximas semanas que passei com minha mãe na vila, eu fiquei literalmente isolado do mundo. Eu tinha que administrar o tempo que eu passava no celular não por medo de que o meu crédito pré-pago se esgotasse, mas temeroso de que minha bateria se esgostasse. Nesse caso eu teria que ir para Enugu (30 quilômetros de distância) para recarregá-lo – se é que de fato Enugu tivesse abastecimento elétrico naquele momento. Está ruim assim na Nigéria, a que uma vez se auto-proclamou o gigante da África? Eu nem quero falar sobre as estradas Nigerianas, ou o abastecimento de água, ou saúde pública. Estão todas em condições pavorosas e ainda assim o ministro de Comunicação considerou necessário recategorizar o país.

Receio estar cometendo o erro de estar contando uma única história - da falha do meu amado país. Visto que eu sou de origem muito pobre, e visto que a minha família ainda não saiu da pobreza, há uma probabilidade de que eu veja a realidade da África por uma perspectiva bastante negativa. A respeito disso, eu preciso imediatamente afirmar que minha estória não representa a experiência de todos os nigerianos. Graças a Deus, não é. Há muitos nigerianos bem situados por lá, como foi eloquentemente colocado por Chimamanda Ngozi Adichie em seu discurso. Mas enquanto é verdade que nem todos os Africanos vivem em pobreza profunda e ignorância e doença, a questão mais perturbadora, porém, é que muitos vivem, demasiados números. E não há justificativa para tal.

Meu pensamento é que se pelo menos 50 por cento dos Africanos poderiam gabar-se de ter educação média e infraestrutura básica como abastecimento de água e eletricidade constantes, boas estradas e segurança, nossos intelectuais não precisariam se preocupar com o olhar Europeu. Mas visto que muito Africanos ainda estão chafurdando na pobreza, seus direitos sendo negados a eles, só podemos cogitar se é mais importante explicar e recategorizar a África do que mudá-la? Seria possível examinar o porquê de líderes Africanos não terem respeito pelo sue próprio povo?

Talvez seja uma das ironias da África de que quase um ano após Binyavanga Wainaina ter publicado o seu respeitado ensaio, o Quênia estava conturbado por violência política como consequência da eleições de 2007. O que o mundo viu no surgimento daquela crise indicava talvez que líderes intelectuais daquele país podem ter falhado em escrever sobre seu próprio país de formas que teriam exposto o mau que estava supurando durante esse tempo.[3] Muitos Africanos preocupados ainda estão ainda tentando descobrir como seria possível que um soldado de 46 anos de idade, Capitão Moussa Dadis Camara, poderia manter a Guiné – um país de mais de 10 milhões de pessoas – refém.

De fato, em 28 de Setembro de 2009, forças de segurança voltaram-se contra pessoas que protestavam reunidas no estádio nacional na capital, Conakry, para protestar contra o governo. Mais de 200 pessoas mortas a tiros imediatamente. Muitas mulheres foram estupradas ao ar livre por soldados. Talvez o consolo nessa situação delicada da erupção dessa violência é que a maioria das notícias foi feita por pessoas locais que queriam que essas cenas fossem expostas ao mundo, tomaram uma postura contra as forças da escuridão. Eles não pensaram sobre o que significaria para a imagem da África; eles foram motivados por um sentimento de decência e um necessidade de resguardar o que é humano neles.

No livro de J. M. Coetzee ‘Age of Iron’, a senhora Curren, uma professora sul africana branca de artes e literatura clássicas, morava em um existência protegida por quase toda vida. Sua vida começou a se desenredar-se quando ela é diagnosticada com câncer. Ao voltar do médico para casa, ela descobre que um homem sem teto escolheu a sua área residencial para morar. Pela graça de uma série de incidentes, sua ajudante negra Florence, leva-a para Guguletu, um município negro no qual ela experiencia em primeira mão os horrores do apartheid e a brutalitade policial. A vida dela ou o que restava dela mudaria. Em uma de suas epifânias, ela se faz uma pergunta moralmente relevante: ‘E eu? Onde está o meu coração nisso tudo?’

Eu não vejo nenhuma razão pela qual a onda de más notícias na Nigéria não seja interrompida. Talvez tudo que será necessário é uma mudança de postura que comece como a rejeição radical do pensamento de que o Ocidente esteja apenas interessado em escavar o território africano. Se o ataque de Chinua Achebe a Joseph Conrad e companhia foi oportuno há 50 anos, fazer o mesmo nesse novo século, eu acredito, é um pouco contraproducente para a mente Africana.

Ainda assim, eu compartilho com a ideia de Camus de que nós deveríamos imaginar que Sísifo poderia estar feliz se soubesse que estava empurrando a pedra correta; se ele soubesse que aquela realidade era absurda e que a única coisa a fazer diante do absurdo era confrontá-lo. Sim, confrontá-lo com a coragem do Deus Ogun, cuja postura moral determinada e um extinto de rebelião de Prometeu, de acordo com o Ogun de Wole Soyinka, (5) libertou o homem do seu desespero destruidor.

* Chielo Zona Eze é um escritor nigeriano e filósofo. Ele ensina inglês e literaturas póscoloniais em Northeastern Illinois University, Chicago. Ele é u autor de 'The Trial of Robert Mugabe'. Ele participa na blogsfera em chielozona.blogspot.com andafricanliteraturenews.blogspot.com.

**Traduzido por Raquel de Souza e Alyxandra Gomes Nunes

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NOTAS
[1]http://www.ted.com/talks/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_stor…
[2]
[4]
http://www.nytimes.com/2009/10/06/world/africa/06guinea.html
[5] Wole Soyinka, Myth, Literature and the African World. London: Cambridge UP. 1976. (146)